quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Chove chuva...




As primeiras chuvas começaram a cair na capital do País. Silvia saiu às oito da noite da redação e olhou para o céu, negro e chamativo. As ruas estavam alagadas. Levou mais de quarenta minutos para chegar em casa. Tentou ligar a luz... Casa escura, água fria e chuva lá fora. O silêncio caiu bem, tinha tempo que não sabia o que era isso. Água gelada? Só no calor para matar a sede, mas naquela noite o banho foi assim... Acendeu velas aromatizadas e abriu um bom vinho. A bebida na taça formava uma imagem destorcida. O vermelho se misturava com o laranja do fogo.

Silvia foi para janela e ficou olhando os pingos grossos que caiam. Uns sobre os telhados, uns na grama, outros nem chegavam ao chão. E outros refrescavam seus braços encostados na janela. Ao longe, o barulho da buzina fez Silvia lembrar que, a cada chuva, Brasília pára. O trânsito fica caótico. Aumentam os acidentes, batidas bobas por causa daqueles que insistem em andar colados na traseira. Outras mais graves. Grave mesmo é a situação dos que moram em invasões na capital. Os barracos são arrastados pela chuva. Famílias perdem tudo, roupa, comidas, móveis e perdem a dignidade.

O governo sabe que as famílias estão lá. Por que esperar a chuva? Talvez, porque isso é notícia e notícia chama imprensa e imprensa é publicidade gratuita e espaço pra fazer “politicagem”. As famílias desabrigadas e molhadas tentam recuperar o que sobrou do que um dia chamaram de casa. O governo como consolo diz: eles serão levados para os abrigos da cidade.


Silvia deu um intenso gole no vinho. Admirou sua casa. Se sentiu em uma fortaleza. Colocou o pijama e foi dormir. Na madrugada, os gráficos rodavam o jornal. A foto da manchete: uma criança descalça, com a chupeta na boca, olhando para o brinquedo coberto de lama. “Chove chuva, chove sem parar...”

* Foto retirada do site www.fotosearch.com.br

4 comentários:

Marina Amaral disse...

Será que a chuva adormeceu meus leitores???

Felipe disse...

Essa Silvia eu acho que nao era ficticia nao e tinha outro nome.

E sua veia política nao deixou de dar uma cutucada no problema social mesmo em uma cronica sobre a vida cotidiana. :)

Beijo

Gabriela Matarazzo disse...

Você e o Carlos combinaram né? Porque ele tbm escreveu sobre chuva!!! hehe e confesso q me deu um sono e aquela vontade de não fazer "nada". hehe adoro!

Rodrigo Otávio disse...

HUM, adoro quando a chuva cai nesse cerradão e faz nascer vida onde pensavámos que estava tudo morto por causa da seca. O renascer de fênix dessa flora tão exuberante é sempre um milagre. No contra-ponto, os "chafurdos" politiqueiros sempre rondam como urubus a desgraça das pessoas. Na chuva então, fazem a festa! É cobertor de um lado, sopinha de outro, e um discurso sempre pronto, e no gerúndio: "Nós vamos estar providenciando a solução deste problema". Presenciei isso quando fui cobrir os estragos que a chuva fez em um bairro bem pobre, contraditoriamente vizinho de um bairro bem rico, e próximo à residência de um polítco famoso, em um certo balão do "Torto", na Capital do País.