terça-feira, 23 de março de 2010

Chove chuva...

Silvia saiu às oito da noite da redação e olhou para o céu, negro e chamativo. As ruas estavam alagadas. Levou mais de quarenta minutos para chegar em casa. Tentou ligar a luz... Casa escura, água fria e chuva lá fora. O silêncio caiu bem, tinha tempo que não sabia o que era isso. Água gelada? Só no calor para matar a sede, mas naquela noite o banho foi assim... Acendeu velas aromatizadas e abriu um bom vinho. A bebida na taça formava uma imagem destorcida. O vermelho se misturava com o laranja do fogo.

Silvia foi para janela e ficou olhando os pingos grossos que caiam. Uns sobre os telhados, uns na grama, outros nem chegavam ao chão. E outros refrescavam seus braços encostados na janela. Ao longe, o barulho da buzina fez Silvia lembrar que, a cada chuva, Brasília pára. O trânsito fica caótico. Aumentam os acidentes, batidas bobas por causa daqueles que insistem em andar colados na traseira. Outras mais graves. Grave mesmo é a situação dos que moram em invasões na capital. Os barracos são arrastados pela chuva. Famílias perdem tudo, roupa, comidas, móveis e perdem a dignidade.

O governo sabe que as famílias estão lá. Por que esperar a chuva? Talvez, porque isso é notícia e notícia chama imprensa e imprensa é publicidade gratuita e espaço pra fazer “politicagem”. As famílias desabrigadas e molhadas tentam recuperar o que sobrou do que um dia chamaram de casa. O governo como consolo diz: eles serão levados para os abrigos da cidade.

Silvia deu um intenso gole no vinho. Admirou sua casa. Se sentiu em uma fortaleza. Colocou o pijama e foi dormir. Na madrugada, os gráficos rodavam o jornal. A foto da manchete: uma criança descalça, com a chupeta na boca, olhando para o brinquedo coberto de lama. “Chove chuva, chove sem parar...”

*Crônica escrita por Marina Amaral e publicada no blog em 1° de outubro de 2009.

terça-feira, 16 de março de 2010

De quem é a culpa?

Existe um mito na história do Brasil que diz: a expulsão dos holandeses foi prejudicial ao Nordeste, que com eles teríamos ficado muito melhores... Recife fica numa celebração a meu ver, boboca, destes poucos anos em que foi dominada pelos holandeses. Assim, como São Luís fica se vanglorando da origem francesa. Pura Tolice!

O sistema colonial que a Companhia das Índias Ocidentais previu para o Brasil era baseado na mesma linha mestra de Portugal, a cana-de-açúcar em sistema de plantation. Estive em Curação e a ilha não é um país desenvolvido, apesar de linda (como o Nordeste). Indonésia e Suriname são exemplos certeiros de que os holandeses não iriam fazer muita coisa diferente no Nordeste.

Os franceses também não teriam feito por São Luís melhor que os portugueses e o exemplo é ainda mais contundente - o Haiti foi colônia francesa. Nem a colonização Inglesa era garantia alguma, vide a paupérrima Guiana Inglesa. Aí fica a questão: mas por que os Estados Unidos e o Canadá ficaram desenvolvidos? Aquela velha história de colônia de povoamento/exploração vem a tona...

É a máxima! Somos pobres. De quem é a culpa? Claro que é da Europa, que primeiro nos explorou e depois dos EUA, que continuou. Evidente que a culpa não é nossa, a culpa é do Imperalismo, diz o perfeito idiota latino-americano que é livro excelente sobre a questão. (Manual do Perfeito Idiota Latino Americano, Autor: Mendoza, Plinio Apuleyo; Llosa, Alvaro)

Esta análise não resiste a uma comparação desconcertante: em 1817, o PIB do Brasil era igual aos dos Estados Unidos. Aliás, nesta época, os EUA tinham escravidão, pobreza e conflitos vários. Em 1814, a Inglaterra invadiu facilmente os EUA, saqueram Washington e botaram fogo na sede do governo, que precisa ser pintada de branco de tempos em tempos para disfarçar as marcas do incêndio - e é só por isso que é a Casa Branca.

Se saímos do mesmo ponto quando nos tornamos nação, por que a distância é tão grande hoje?Falta de instituições, de estabilidade política, desrespeito a propriedade privada e aos contratos, os golpes, as quarteladas, a opção pela agricultura (Mauá e Delmiro Gouveia foram tratados quase que como criminosos), várias causas, mas vou enumerar algumas que eu acho que também fazem diferença e são pouco faladas:

1-O Brasil demorou demais a acabar com a escravidão e recebeu escravos demais (recebeu quase 55% de todos os escravos que vieram para a América).

2-O Brasil recebeu imigrantes europeus e japoneses de menos, que era mão-de-obra extremamente qualificada e organizada.

3-Estivemos imersos demais na ideologia católica, que não valoriza o trabalho, o lucro e o mérito pessoal, ao contrário dos protestantes de linha presbiteriana (sei que esta tese é batida, vide Max Weber, mas é comprovada na prática, basta olhar a Alemanha e a Itália, unificados na mesma época, com população e área parecidas).

4-Não nos envolvemos o tanto que deveríamos e poderíamos nas duas guerras mundiais, perdemos este bonde. Pode chamar de politicamente incorreto, mas nada melhor que uma guerra para desenvoler a economia.

A Constituição dos EUA, de 1787, estabelecia mandato de quatro anos com direito a reeleição, sem especificar o número possível destas reeleições. George Washington herói nacional(?!?), elegeu-se em 1788 para presidente, em 1792 foi reeleito para mandato até 1796. Em 1796 poderia se candidatar de novo e estava praticamente eleito. A Constituição permitia. Aí pensou bem e disse: "Tá bom, oito anos é um tempo razoável, mais que isso vira monarquia, e foi para se libertar de uma que a gente fez a guerra, é saudável que haja alternância de poder, porque ninguém é iluminado."
Ainda que um governo esteja indo bem, é bom mudar, porque o outro pode trazer nova contribuição e evita que o grupo acabe ficando viciado no Estado. O Poder, na república de verdade, somente se justifica se for transitório. Sábias palavras, acho que talvez a explicação da tal distância BRASIL/EUA esteja por aí. Nestes tempos de 2010 é bom lembrar isto porque, como diz meu pai, para o bom entendedor tiro de meta é pênalti.

Sei que algumas ideias são polêmicas... Mas, gosto de provocar mesmo!
* A autoria do texto é do procurador Federal Alisson do Valle Simeão.

sexta-feira, 12 de março de 2010

Abstrata

Já viu crianças do maternal em uma “aula de artes”? Elas gostam de pintar com “tinta guache”... A obra que surge, eu classificaria como “abstrata”. Mas tem outra coisa que estou considerando abstrata também. É a situação política do DF... Desde quando abriram a Caixa de Pandora que muita gente sumiu do tal governo.

Secretários! Acho que nem existe mais esse cargo. Agora é só secretário-interino... Deputado com partido também é coisa rara, a moda é se desfiliar... Governador? Esse cargo virou história em Brasília. Pela primeira vez, vimos um preso. Quem assumiu a vaga deixada, eu não conheço e se quer votei nele.

Nessa obra abstrata, chamada política, ainda tem elementos ilusionistas. Um tal deputado foi preso. Mas o homem pode assumir uma vaga na Câmara Legislativa deixada por um outro deputado, também envolvido no esquema de corrupção.

É uma mistura, igual a das crianças na aula de artes. O papel é um verdadeiro borrão, você não consegue identificar as cores e nem o que elas formam. Na obra candanga, também é assim: você não consegue dizer quem é quem e nem onde isso vai terminar...